Destroços
Sente-se no ar um prenúncio de morte! A calçada molhada faz
os cheiros mais intensos. Os músculos retraem-se enquanto caminham juntamente
com a chuva. Os sítios esquecidos são visitados para matar memórias antigas. Os
bebés que nascem neste momento; estão todos juntos na sua solidão,
característica inata dos Homens. No cérebro confuso a dor confunde-se com a vida,
o choro cai pela face escura e triste, os ponteiros do relógio estão parados
enquanto o tempo se perde em si mesmo e as lágrimas continuam a brotar das
nuvens cinzentas que escondem o Sol.O homem está perdido e a vida flui como a
areia de uma ampulheta, eternamente sozinha nos destroços da cidade destroçada,
simulacro do coração humano.
Os selvagens
destilam cactos no alambique e inventam novos deuses, vozes interiores que
cantam o fado, porque nada mais há que fazer. E os copos que se vão esvaziando
vão ficando em cacos, o vidro partido é utilizado para fazer cicatrizes que
demoram a sarar, e põem as paredes manchadas de sangue
Eu que crio deuses
faço uma ode ao homem solitário - Abandona a estrada deserta. Fecha os olhos
cansados. O sono que vem desperta a tua alma imprudente. Que o bagaço põe
quente. Os teus sentidos arrepiados. Larga a tua vida irreal. Põe os teus pés
no chão. Descansa o teu corpo no areal. E deixa que a chuva te transporte. De
encontro a quem te espera, a morte. Na dúvida de que encontres a razão.
_ Dou-te beijos até te partir a boca
-
Devoro-te
a mandíbula
-
Enfeito
o teu coração com ossos
-
Dispo-te
na noite do meu olhar
-
Bebemos
o sangue com que celebramos a morte
-
Olhamos
a lua e duvidamos
-
As
nossas caveiras desmancham-se de riso
-
O
humor dos teus olhos desfaz-se na terra onde enterramos os nossos corações
-
Caminhamos
no escuro e não proferimos nenhuma palavra
-
Os
morcegos perseguem-nos com o seu voo cego, num céu com a cor ténue do fumo que
enevoa os nossos pensamento. Temos dois cães que nos seguem para todo o lado e
fodem as cadelas com o cio
Nenhum segredo ele
arrotou.
Nenhuma confissão entre os soluços. Só aquele murmúrio
constante dos loucos em declínio. Com olhos vazios, olhos cegos
Balouçando-se
ligeiramente na cadeira. Ao primeiro murro bateu com a cabeça no chão partindo
o nariz. O primeiro pontapé trocou-lhe algumas costelas de lugar
Na quarta investida
parou de murmurar. Na sexta, já pouca coisa se distinguia do seu corpo. À
décima investida pararam. Restava um montículo de tripas e sangue junto a uma
cadeira partida. O pó assentou… E então, naquele quarto salpicado de sangue…
O escorpião
controla a máquina
que me controla a mim. Mora num deserto em cima duma rocha. Onde leva os dias a
ler o manual e a carregar nos botões. Eu vivo numa jaula, tenho os olhos secos
e as mãos ensanguentadas. O homem que me observa está com uma expressão de
entendido. Passam por aqui peritos do mais alto gabarito. Os seus óculos estão
embaciados da sua respiração ofegante
Eu sou alimentado com
laranjas. A minha merda é verde
Ele aproxima-se das
grades e eu afasto-me. Fui treinado para este tipo de encontro
Ele não tem olhos e no entanto trespassa-me com a sua
presença. Diz que o dia está a acabar. Que tenho de me ir embora. Para pegar na
minha mala e pôr-me na estrada. Longe de estar aqui. Tento ver a estrada no
precipício que leva a praia
O sol põe-se, está frio, alegre, triste, nocturno. Eu
amo-te! Mas e tu? Também esperas a próxima música?
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